sexta-feira, 20 de maio de 2011

Deu no NY Times: A revolução das babás no Brasil

Enviado por luisnassif, sex, 20/05/2011 - 09:16

Autor: Alberto Porém Júnior

Babás com mobilidade social ascendem para a classe média brasileira
Alexei Barrionuevo
Em São Paulo

Myrna Domit contribuiu com a reportagem.

Em uma década trabalhando como babá, Andreia Soares finalmente subiu a escada social para a classe média do Brasil.

Com o dinheiro que ela poupou, ela comprou um apartamento de dois quartos com cozinha com bancadas de granito e uma pequena varanda, uma casa para sua mãe, um terreno para seu irmão, e uma bolsa Louis Vuitton de Paris, que ela tira orgulhosamente de um armário.

No final deste ano, com seu salário mensal de R$ 5.000, que ela ganha cuidando de uma menina de 10 meses em um bairro nobre, ela planeja comprar um carro de R$ 62 mil –em dinheiro.

“Eu sempre tive esse sonho de comprar uma casa e um carro”, disse Andreia, 39 anos. “Hoje, esse sonho está mais próximo do que nunca para as babás.”Apesar de ter se saído melhor do que muitos de seus pares, Andreia faz parte de uma revolução que está fazendo em pedaços o estereótipo colonial de ajuda doméstica dedicada, mas barata, na América Latina.

À medida que crescem suas expectativas de uma melhor qualidade de vida, as babás estão cada vez mais buscando trabalhar para os muito ricos e se tornando menos acessíveis para as muitas famílias de classe média. A mudança está provocando ondas de tensão de classe, representando um problema incômodo em uma sociedade em mais mulheres estão entrando na força de trabalho, mas sem o tipo de sistema elaborado de creches existente em alguns países industrializados.

Os tempos em que babás de uniforme branco trabalhavam por salário servil, com apenas dois dias de folga a cada 15 dias, estão chegando ao fim. Babás com melhor qualificação se recusam a trabalhar nos fins de semana e exigem salários que são duas a quatro vezes maiores do que recebiam há apenas cinco anos. Um crescente número se recusa a dormir na casa dos patrões ou está deixando a área, optando por empregos que permitem mais tempo para a vida particular, segundo pais, babás e diretores de agências especializadas.

A renda dos empregados domésticos no Brasil, incluindo babás e empregadas, cresceu 34% de 2003 a 2009 –mais do que o dobro do aumento médio para todos os trabalhadores do Brasil– disse Marcelo Neri, um economista da Fundação Getúlio Vargas. Ao mesmo tempo, ele disse, a carga horária dos trabalhadores domésticos caiu 5%, para 36,2 horas por semana.

“Hoje, o que eu espero de um emprego de babá é diferente do que antes”, disse Ieda Barreto, 32 anos. Há sete anos, ela ganhava cerca de aproximadamente R$ 600 por mês, com folga apenas às quintas, o que dificultava manter um relacionamento com um namorado. Hoje ela espera ganhar quase R$ 3 mil trabalhando de segunda a sexta, e cobra R$ 400 adicionais para trabalhar nos fins de semana.“Eu estou à procura de qualidade de vida”, disse Ieda. “Eu me valorizo muito mais do que antes.”

O aumento das expectativas reflete o crescimento da classe média brasileira, que cresceu para quase 55% da população em 2010, em comparação a 37% em 2003, disse Neri. Hoje, “o Brasil está se tornando como os Estados Unidos”, onde empregos domésticos que recebem por hora são mais comuns do que babás que dormem na casa dos patrões, disse Jacqueline Szwarc, uma psicóloga que estava pegando seus filhos em frente a uma escola particular em São Paulo. “Os salários subiram muito e a procura por ajuda doméstica se tornou muito difícil.”A oferta de babás encolheu à medida que algumas passaram a procurar emprego no mercado de trabalho em expansão, provocando uma alta dos salários daquelas que permaneceram no campo, disseram economistas, babás e diretores de agências especializadas. Muitas das babás restantes passaram a fazer cursos para se tornarem melhor qualificadas e para ajudá-las a encontrar trabalho em lares mais ricos, onde podem cobrar muito mais.Enquanto algumas mães consideram as mudanças como boas para o desenvolvimento do Brasil, muitas estão revoltadas. Antes isoladas, as babás agora trocam informações a respeito do mercado e condições de trabalho por e-mail, blogs e redes sociais.“É uma máfia”, disse Jacqueline, 44 anos, acrescentando que ela tem sorte em manter a mesma babá há 10 anos.Há seis anos, Evanice dos Santos, uma ex-babá que virou blogueira, não tinha acesso à Internet e encontrava outras babás em um clube em São Paulo, do qual seus empregadores eram sócios. Agora casada, ela se dedica a ajudar online amigas babás “a encontrarem um melhor caminho” para ganharem mais dinheiro e terem um horário de trabalho melhor. Algumas babás bem remuneradas em São Paulo já contratam babás para seus filhos. Andreia disse que amigas babás que ganham mais de R$ 7 mil por mês estavam pagando babás com menor qualificação por pouco mais de R$ 1.400 por mês para cuidarem de seus filhos.

Como um crescente número de pais, Rafaella Toledo trouxe sua babá do Paraguai, e pais disseram que babás do Peru também estão chegando a São Paulo. “A situação é terrível”, disse Rafaella. “Agora que estou grávida, eu terei que procurar por alguém que não seja babá, porque as babás acham que estão em outro nível agora.”

Michelle Tchernobilsky, 29 anos, mudou de babá umas 10 vezes no último ano, em busca de alguém com preço acessível, mas qualificada o suficiente para cuidar de seu filho de 10 meses. Cortar a babá de suas despesas mensais não é uma opção para Michelle, uma gerente de relações públicas, assim como também não é pagar um salário que ela considera exorbitante. “Nós somos reféns”, ela disse.

Marilia Toledo, a proprietária da agência de babás Masa, disse que o mercado em São Paulo, a maior cidade da América do Sul, se transformou em uma “guerra” entre babás exigentes e pais tentando conter a inflação das babás. “As coisas estão mudando rápido demais e de forma abrupta”, disse Marilia, que é dona da agência há 20 anos. “Ninguém estava preparado para isso.

Entre os principais pedidos que ela recebe, ela diz, está o de uma babá que nunca trabalhou em São Paulo, porque elas são “mais humildes”.

Marilia e alguns economistas estão céticos a respeito de quanto tempo a revolução conseguirá durar. Neri disse que os brasileiros ainda têm níveis baixos de escolaridade: em média sete anos de estudo para adultos com mais de 25 anos. Rodrigo Constantino, um economista da Graphus Capital, disse que a falta de investimento em educação no Brasil impedirá muitos trabalhadores domésticos de encontrarem trabalho mais bem remunerado, e exigências salariais incessantes podem provocar mais inflação.

“O Brasil está montado nesta onda e cada classe está subindo a escada”, disse Constantino. “O problema que eu vejo é como isso será sustentável.

Ainda assim, babás como Andreia estão investindo em si mesmas. Tudo começou há nove anos, quando ela fez um curso de enfermagem. Dois anos depois ela fez um curso especializado de babá. No ano que vem ela planeja fazer um curso de inglês.

“As pessoas em nosso campo estão começando a obter mais qualificações e estão procurando por famílias com mais dinheiro para pagá-las”, disse Andreia. “Por causa disso, muitas mulheres estão perdendo suas babás.

Após dois anos trabalhando como babá em Nova York, ela foi parar no ano passado na casa de Fernanda Parodi, uma advogada casada com um presidente-executivo em São Paulo. Fernanda disse que não tem queixas a respeito do salário de Andreia, apesar de aconselhá-la a comprar um carro mais barato.

“Eu não quero que ela vá embora”, disse Fernanda, 38 anos, que está considerando promovê-la a assistente pessoal.

Onde algumas mães veem uma revolução debilitante, ela vê progresso social.

“Se o Brasil deseja deixar de ser um país de terceiro mundo, então é preciso permitir que todos participem do crescimento”, disse Fernanda. “É o preço que se paga pelo progresso.”

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